O sonho da cantora Christine Kamba, de 27 anos, de gravar seu primeiro CD gospel foi interrompido há dois anos pela guerra civil do Congo, que já dura mais de 20 anos. Ela teve que se refugiar no Brasil, mais precisamente em Jardim Gramacho, em Duque de Caxias, na Baixada Fluminense, junto com seus quatro filhos, por causa do conflito. Por aqui, em meio à pobreza e às precárias condições de vida, ela tenta retomar sua vida.
— Vivo de doações, de caridade. Também canto na rua em troca de dinheiro. Em termos financeiros, minha vida aqui está pior que no Congo. Não consigo nem creche para os meus filhos — lamentou.
De língua nativa francesa, ela frequenta duas vezes por semana um curso de Português para refugiados na Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj). Vencer o desafio de aprender a língua falada no Brasil não foi suficiente para garantir um emprego. A congolesa admite que sofre preconceito.
— Tem gente que não gosta nem de tocar na gente — desabafou.
A situação vivida por Christine é a mesma de pelo menos outras 60 famílias congolesas que vivem em Jardim Gramacho. O número é da Cáritas, uma entidade da Igreja Católica que atua diretamente junto aos refugiados. É a instituição também que ajuda os refugiados a legalizarem sua situação no país.
— Nosso trabalho é acolhê-los, orientá-los a respeito do processo de solicitação de refúgio e criar condições para que consigam se integrar e acessar as políticas públicas às quais têm direito — explicou Aline Thuller, coordenadora do Programa de Atendimento a Refugiados da Cáritas do Rio de Janeiro.
A congolesa Bernadete Umba, de 29 anos, está desempregada e vive com seus dois filhos em Jardim Gramacho:
— Estou no Brasil há um ano e cinco meses e fugi do meu país por causa da guerra. Trabalhava com vendas e decoração, mas desde que cheguei não consegui emprego. Morar em Jardim Gramacho é pior do que no Congo, mas é a opção que nós temos. As casas são ruins. O preconceito e o racismo aqui são muito fortes. Já cheguei a chorar por causa da aversão das pessoas, que diziam que a gente tinha filhos que nem porcos. Comecei a fazer o curso de Português para batalhar alguma coisa melhor.
Em Gramacho
Além da Cáritas, as 60 famílias refugiadas são assistidas pelo Centro de Referência de Assistência Social (Cras) da região. São, ao todo, quase 200 pessoas.
No estado
Ainda segundo dados da Cáritas, existem 901 congoleses reconhecidos como refugiados em todo o Rio e outros 612 aguardando uma resposta do governo brasileiro.
Como ajudar
Para ajudar a Cáritas Rio, as pessoas podem doar por depósito (Bradesco / Ag.: 0814 / CC: 76565-1 / CNPJ 34267971/0001-14) ou através do site (www.caritas-rj.org.br). As doações têm fins diversos, como garantir auxílio emergencial para os casos mais vulneráveis, custear abrigo seguro, apoiar inserção profissional e pagar medicamentos.
A guerra
O conflito entre a Aliança de Patriotas por um Congo Livre e Soberano (APCLS), formado por homens da etnia hunde, e as Forças Democráticas para a Liberação de Ruanda (FDLR), de hutus, esconde o interesse pelo controle das riquezas minerais do país, onde se encontra facilmente ouro e diamante. As mulheres e crianças são os principais alvos dos rebeldes.
Refugiado
É a pessoa que é perseguida devido à sua raça, religião, nacionalidade, ou por causa de uma guerra local, que se encontra fora do seu país de origem e que não pode, ou não quer retornar ao mesmo. Se conseguir a documentação necessária, não vive em situação irregular no país que o acolheu.
Por: Igor Ricardo
via: jornal extra
30/04/2017