O Ministério Público Federal (MPF) ajuizou ação civil pública para suspender e reverter intervenções realizadas na faixa marginal de proteção da Lagoa de Araruama, em São Pedro da Aldeia (RJ), para a construção irregular de um condomínio. A ação pede, em caráter urgente, que a Justiça determine a suspensão imediata das obras do empreendimento Brisas da Lagoa e quaisquer outras intervenções indevidas. Entre as irregularidades apontadas estão a engorda da faixa de areia da lagoa e a pavimentação de novo trajeto de rua na área de proteção.
A ação pede que os réus – o Empreendimento Brisas da Lagoa, o município São Pedro da Aldeia e o Instituto Estadual do Ambiente – sejam condenados a desfazer as intervenções e obras irregulares e a não colocar estruturas de uso privado sobre a faixa marginal de proteção da lagoa. Além disso, cobra a reparação integral dos danos ambientais causados e o pagamento de indenização por danos morais coletivos em valor não inferior a R$ 1,5 milhão para cada réu.
Inquérito civil instaurado pelo MPF apontou que o empreendimento Brisas do Lago prevê a ocupação de parte dos 15 metros de faixa marginal de proteção da Lagoa de Araruama como área de uso privado, com a construção de guarita, estacionamento e piscina, o que, por si só, já constitui violação ao direito de uso comum do local.
Irregularidades – Além disso, as investigações revelaram inúmeras irregularidades nas intervenções realizadas para implantação do condomínio, entre elas, as promovidas para engorda da faixa de areia. Segundo o inquérito, não foram elaborados laudos de colimetria (quantificação de coliformes) das areias de engorda, dragadas do Canal de Itajurú. No entanto, os resultados das coletas realizadas na investigação indicaram contaminação por efluentes sanitários.
Também não foram apresentados estudos sobre os impactos de uma eventual redução do espelho d'água da lagoa, como alterações na circulação hídrica e na sua biodiversidade, bem como o agravamento das inundações no período de chuvas intensas. Além disso, não houve estudos sobre a dinâmica das correntes e o possível retorno da areia da engorda ao corpo hídrico da Lagoa de Araruama – o que gera sucessivas dragagens, com grande gasto de recursos públicos. O inquérito mostra também que não houve prévia autorização pela Secretaria do Patrimônio na União, ainda que as intervenções tenham sido realizadas em bem público federal.
Além da engorda irregular, o inquérito civil apontou que, para viabilizar a implantação do condomínio, os réus deslocaram a trajetória da Avenida Luís Sampaio para aumentar o espaço útil do empreendimento e pavimentaram nova rua - denominada Rua Praia Linda - na faixa marginal de proteção, onde antes estava a faixa de areia e a vegetação nativa no local. A engorda da praia lagunar, por sua vez, foi o que viabilizou que essa nova rua fosse transposta para trecho anteriormente ocupado por areia e vegetação, causando significativos impactos ambientais e sociais.
Na ação, o procurador da República Leandro Mitidieri lembra que, com a Constituição Federal de 1988, o direito ambiental foi expressamente consagrado como direito fundamental, impondo-se a todos, especialmente aos poderes públicos, o dever de atuar para sua efetiva proteção. Além disso, destaca que entre os espaços que merecem especial proteção, destacam-se as faixas marginais de proteção, que são faixas de terra necessárias à proteção, à defesa, à conservação e operação de sistemas fluviais e lacustres. A dragagem de areia e engorda de praias vêm sendo ativamente fiscalizada pelo MPF, com destaque para a Região dos Lagos, tendo sido emitidas diversas recomendações em 2023 e 2024.
Lagoa de Araruama – Situada na Região dos Lagos, no estado do Rio de Janeiro, a Lagoa de Araruama é um dos maiores corpos de água hipersalina – ou seja, mais salgada que a água do mar – do mundo. A lagoa se estende por 160 dos 850 quilômetros da região costeira do RJ. Além de São Pedro da Aldeia, outras cinco cidades são banhadas por suas águas salgadas: Araruama, Iguaba Grande, Saquarema, Cabo Frio e Arraial do Cabo.